"O torturador não é um ideólogo, não comete crime de opinião, não comete crime político, portanto. O torturador é um monstro, é um desnaturado, é um tarado" (Ayres Brito)

terça-feira, 8 de agosto de 2017

Antropologia Jurídica - I) MAGIA, PODER E DIREITO

I) MAGIA, PODER E DIREITO
- A magia: a magia é, em primeiro lugar, o elo místico do homem primevo com a natureza, uma natureza possuidora de forças – reações – incognoscíveis, diante das quais o homem está em relação de inferioridade. As comunidades primárias, diante da potencialidade superior da natureza, reproduzem em seu “formalismo” da experiência cotidiana o sacrifício sagrado de subserviência a essas potencialidades. Não é a razão da ciência, não é a lógica formal do conhecimento, mas a adoração e a veneração do que se deixa dominar (ROCHA, 2015, p.83).
A Magia nasce, dessa forma, da completa incompreensão do homem pelo poder dos fenômenos naturais da natureza, como os raios, tempestades, noite, dia, estrelas, enchentes, secas etc.
- Rituais mágicos: os rituais mágicos, no início, para o homem primário, se revestem de um caráter coercitivo por parte dos espíritos, e no sentido indicado pelo praticante dos atos mágicos, o feiticeiro, o xamã, o oráculo. (ROCHA, 2015, p.83).
A verdade é que o feiticeiro exerce uma função de poder sobre os demais membros da tribo.
- Surgimento da Religião e do Direito: Quando, mais tarde, esse mesmo sentimento de potencialidade, que a própria razão científica em vão tenta conhecer, exige outros rituais, a religião estabelecerá a aliança entre o conhecimento analítico e a fé, agora, porém, com algum impedimento da arbitrariedade da ação divina, estabelece-se certa juridicidade. (ROCHA, 2015, p.83/84)
Neste sentido, quando o homem inseri a razão científica na busca de tentar compreender “as potencialidades” da natureza, a soma da razão científica, produz novos rituais que transforma magia em religião, com o predomínio da fé, e, agora, de certos limites ao “feiticeiro”, trazidos pela razão, surgindo o embrião da juridicidade, e assim, o Direito.
- Surgimento do binômio Religião e Ciência = Poder:
Estamos diante do surgimento do binômio Religião e Ciência, em uma visão materialista, com em Engels (1820-1895), a religião aparece junto com o direito e de maneira apolítica, portanto, junto com a razão científica, como uma ciência a par das outras. [...] A virtude da visão de Engels é que religião e ciência passam a ser produtos de uma mesma razão, como tal se complementam – metafísico e empirismo, divindade e experiência. Nesse sentido, tanto a ciência como a religião, para o homem não primevo, são produtos de uma mesma reação a conquistar o conhecimento e também, portanto, produto de relações concretas dos homens em seu devir de sobrevivência, que podem atender, e atendem, a forças, não mais da natureza, mas de poder. (ROCHA, 2015)
- Para Comunidades Primárias – Magia como surgimento do Direito Primitivo:
Para as comunidades primárias, a magia é a um tempo a adoração e a integração com o meio natural potencialmente superior, e de imediato, como forma e meio a partir do qual se estabelecem as práticas de sobrevivência material. Assim, pode-se dizer que a magia está na origem do “direito primitivo”, na explicação e determinação regras de conduta e sanções impostas diante da desobediência a essas mesmas regras. Pesquisas antropológicas têm demonstrado, em diversas organizações sociais menos diferenciadas, que a magia exerce um papel comum quando se trata de estabelecer a RECIPROCIDADE, no respeito e devoção do homem com a natureza, e por isso mesmo, a mesma igualdade entre os membros da comunidade, diferentemente do nosso tipo de organização social que se caracteriza pela COMPETITIVIDADE, tanto em relação ao meio ambiente como em relação a nossos semelhantes. Como se disse anteriormente, a dominação da natureza acaba produzindo a dominação do homem. (ROCHA, 2015, p.84)
- Direito e Religião:

A etapa intermediária entre o direito mágico das comunidades primárias e o direito de nossas sociedades com Estado foi, em muitos casos, o direito religioso e divino. Por todas as sociedades do Ocidente e por todas as civilizações antigas do Oriente houve ordenamentos jurídicos com base no divino. Isso levou à especialização de um clero e à preponderância de um segmento social formal por teólogos-juristas, que rapidamente construíram uma estrutura administrativa e burocrata que, ao sabor dos interesses dos grupos dominantes, estabelece os direitos e as sanções sociais a cada época. Assim, o direito e a religião, longe de ser instrumento de igualdade e justiça, passam a ser instrumento de poder efetivamente tomado como dominação social, econômica e política. O fim da magia é, igualmente, o fim de uma sociedade igualitária. O império da religião é o dos deuses voluntariosos usados como serviçais das elites poderosas. Quando o direito laico e posto pelos homens surgir e consolidar-se efetivamente, haverá de provar que a escrita da dominação religiosa no direito deverá desaparecer!(ROCHA, 2015, p.87)

segunda-feira, 7 de agosto de 2017

DISCIPLINA TDM - TEMA: VIOLÊNCIA - DOCUMENTÁRIO A TRAJETÓRIA DO GENOCÍDIO NAZISTA


Documentário: A Trajetória do Genocídio Nazista
- “Paris, 1900, mais de 50 milhões de pessoas de todo mundo visitaram a Exposição Universal – uma feira mundial destinada a promover um maior entendimento e tolerância entre nações e celebrar o novo Século, as novas invenções, e o entusiasmo do progresso.
O Século XX começou assim como o nosso – com a esperança de que a educação, a ciência e a tecnologia criassem um mundo melhor e mais pacífico.
No entanto, o que veio em seguida foram duas guerras devastadoras”.

No início do Século XX, com o avanço das ciências, da física, da matemática, da medicina, das fórmulas aplicadas nas ciências exatas, a humanidade ficou tão entorpecida que acreditou que seria possível resolver todos os seus problemas com a aplicação de meras fórmulas estanques.A humanidade acreditou na solução dos problemas por meio da aplicação se simples fórmulas da matemática, da física e da química, que bastaria aplicar uma fórmula e o problema seria resolvido.
A humanidade passou a acreditar em soluções simples para problemas complexos. Passou a acreditar que “O fim, o objetivo, justifica os meios utilizados para alcança-lo”
No direito, iremos observar o surgimento do movimento intitulado Positivismo Jurídico exacerbado com o brocardo:
“Dura Lex, sed Lex” – A Lei é dura, mas é a Lei.
Graficamente, poderíamos representar esse brocardo que vigorou até a II Guerra Mundial da seguinte maneira:

Avanços científicos do início do Século XX

Fórmulas Matemáticas Científicas



Valores Éticos e Morais
No direito, o fenômeno observado é o da criação de leis desacompanhadas de valores éticos e morais. O ápice deste positivismo jurídico débil, em que leis eram legítimas, porém imorais, ocorreram justamente na II Guerra Mundial no regime Nazista em que todos os atos praticados contra o povo judeu estava fundamentado e legitimado em lei. Era Legal, do ponto de vista do Regime Imperialista Alemão, mas absolutamente IMORAL E ILEGÍTIMO, do ponto de vista ético e moral.
"O HOLOCAUSTO OFUSCOU A VISÃO SOBRE A HUMANIDADE E SOBRE O NOSSO FUTURO. ENQUANTO O MUNDO PARA PARA COMPREENDER O QUE HAVIA ACONTECIDO, UM NOVO TERMO, GENOCÍDIO, FOI CRIADO PARA PODER COMPREENDER AQUELES CRIMES. CRIMES COMETIDOS POR PESSOAS COMUNS, DE UMA SOCIEDADE NÃO MUITO DIFERENTE DA NOSSA" (STEVEN SPIELBEG)
- Lei n. 2.889/56. No Brasil, cumpriu-se o mandado de criminalização do genocídio por meio da Lei n. 2.889/56. No entanto, nos crimes de guerra e crimes contra a humanidade, ainda não foi aprovada a legislação interna de complemento ao Estatuto de Roma.
II) CRIMES DE GENOCÍDIO
Lei número 2.889, de 1º de outubro de 1956, define e pune o crime de genocídio
Art. 1º Quem, com a intenção de destruir, no todo ou em parte, grupo nacional, étnico, racial ou religioso, como tal:

a) matar membros do grupo;

b) causar lesão grave à integridade física ou mental de membros do grupo;

c) submeter intencionalmente o grupo a condições de existência capazes de ocasionar-lhe a destruição física total ou parcial;

d) adotar medidas destinadas a impedir os nascimentos no seio do grupo;


e) efetuar a transferência forçada de crianças do grupo para outro grupo;

Com os horrores da II Guerra Mundial, a humanidade compreendeu que algo estava muito errado e havia necessidade de se tomar medidas para tentar evitar e que tais horrores retornassem.
Foi criada a Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948 - Foi criada a Organização das Nações Unidas. Foi criado o:
 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana
No Direito Constitucional registramos um novo marco que foi denominado de "Neoconstitucionalismo" em que podemos definir sua maior característica, ao menos didaticamente, neste primeiro momento, como a reaproximação do Direito aos Valores Éticos e Morais devendo sempre levar em conta o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, que para alguns autores passa a ser elevado a Super Princípio.
Comparato (2008, p. 38) leciona que a cada grande surto de violência, os homens recuam, horrorizados, diante da infâmia e do remorso causado pelos seus horrendos atos [torturas, mutilações, massacres coletivos], que por sua vez, “[...] fazem nascer nas consciências, agora purificadas, a exigência de novas regras de uma vida mais digna para todos [...]”.
Graficamente falando, com os horrores da II Guerra Mundial e a criação da Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, com o super princípio da dignidade da pessoa humana devendo ser considerado o "Norte" orientador do Direito, podemos representar da seguinte maneira:

Avanços científicos do início do Século XX

Fórmulas Matemáticas Científicas
Valores Éticos e Morais
Direito, Lei, Ordenamento Jurídico, Justiça.
Com os horrores da II Guerra Mundial, com a criação da ONU - Organização das Nações Unidas, com a criação de sua Resolução a Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, com o reconhecimento do que alguns autores denominam de "Super Princípio da Dignidade Humana", o Direito obrigatoriamente deve andar lado a lado com os valores éticos e morais. Não basta mais ser legal, deve ser legal, legítimo e  moral.
O brocado positivista que possuía algum valor até a II Guerra Mundial, qual seja "Dura Lex, sed Lex" A Lei é dura, mas é Lei, não mais tem valor em um mundo em que o Poder Judiciário deve buscar a Justiça e não a aplicação estanque da Lei. O Poder Judiciário que nasce das cinzas da II Guerra Mundial não pode mais ser "A Boca da Lei" anunciado por Montesquieu, seu papel, caso a Lei a aplicação da lei seca não leve à justiça deve ser o afastamento da lei e a aplicação de princípios hermenêuticos, como por exemplo, a Dignidade da Pessoa Humana, em busca da concretização da justiça e da Paz social.
    
On the Turning Away
Pink Floyd
On the turning away
From the pale and downtrodden
And the words they say
Which we won't understand
"Don't accept that what's happening
Is just a case of others' suffering
Or you'll find that you're joining in
The turning away"
It's a sin that somehow
Light is changing to shadow
And casting it's shroud
Over all we have known
Unaware how the ranks have grown
Driven on by a heart of stone
We could find that we're all alone
In the dream of the proud
On the wings of the night
As the daytime is stirring
Where the speechless unite
In a silent accord
Using words you will find are strange
And mesmerized as they light the flame
Feel the new wind of change
On the wings of the night
No more turning away
From the weak and the weary
No more turning away
From the coldness inside
Just a world that we all must share
It's not enough just to stand and stare
Is it only a dream that there'll be
No more turning away?
Compositores: Dave Gilmour / Anthony Moore
Letra de On the Turning Away © Sony/ATV Music Publishing LLC

AO DAR AS COSTAS
Ao dar as costas
Aos pálidos e oprimidos
E as palavras que eles dizem e que não entendemos
Não aceite o que está acontecendo!
É só um caso de sofrimento dos outros!
Ou você descobrirá que está se unindo ao dar as costas
É um pecado que de alguma maneira a luz está mudando para a sombra
E lançando seu véu sobre tudo que sabemos
Ignoramos como as massas cresceram, dirigidos por um coração de pedra
Nós poderíamos descobrir que estamos todos sozinhos
No sonho do Orgulho!
Nas asas da noite, como o dia está despertando
Onde os mudos unidos, num acorde silenciosos
Usando palavras que você estranhará e hipnotizado por como eles acendem a chama
Sinta o novo vento da mudança, nas asas da noite
Não mais virar as costas aos fracos e exaustos!
Não mais virar as costas à frieza interna!
Apenas um mundo que todos temos que compartilhar
Não é suficiente apenas ficar em pé e existir!
É apenas um sonho que não existirá!
Não dar mais as costas?
Discriminação racial, xenofobia e intolerância
- A Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial expressamente ordenou a criminalização da discriminação racial. Seu artigo 4º dispões que os Estados devem declarar, como delitos puníveis por lei, qualquer difusão de ideias baseadas na superioridade ou ódios raciais, qualquer incitamento à discriminação racial, assim como quaisquer atos de violência ou provocação a tais atos, dirigidos contra qualquer raça o qualquer grupo de pessoas de outra cor ou de outra origem étnica, como também qualquer assistência prestada a atividades racistas, inclusive seu financiamento.
- Lei n. 7.716, de 5 de janeiro de 1989, também conhecida como Lei Caó, define os crimes de discriminação ou preconceito e suas punições: de acordo com o seu artigo 1º, serão punidos, na forma desta lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional (redação dada pela Lei n. 9.459/97).
- Lei 8.882/94 criminalizou a conduta de fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do nazismo.
- Lei 12.288 de 2010 permite que o juiz determine, mesmo na fase de inquérito policial, a interdição das respectivas ou páginas de informação na rede mundial de computadores.
O artigo 140, parágrafo 3º do Código Penal classifica a injúria qualificada por preconceito: prevê um tipo qualificado de injúria, que comina a pena de reclusão, de um a três anos, e multa, se a injúria consistir na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência.
Violência contra mulher
- Convenção Interamericana para Prevenir Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, também conhecida como Convenção de Belém do Pará (1994): foi explícita em estabelecer mandados de criminalização de condutas de violência contra a mulher. Nos termos do artigo 7º da Convenção, os Estados-partes devem “adotar, por todos os meios apropriados e sem demora, políticas orientadas e prevenir, punir e erradicar a dita violência e empenhar-se em [...] incluir em sua legislação interna normas penais, civis e administrativas, assim como as de outra natureza que sejam necessárias para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher”.
A Comissão Interamericana publicou o Informe número 54/2001, no qual o Brasil foi condenado pela Comissão por violação de direitos humanos causada, basicamente, pela delonga do Tribunal de Justiça do Ceará em aplicar a lei penal contra o acusado em prazo razoável. Com efeito, no chamado caso “Maria da Penha Maia Fernandes”, a Comissão considerou que a delonga por mais de 17 anos em prestar justiça e punir os responsáveis por fatos graves de violência contra a mulher era atribuída ao Brasil, não importando, é claro, terem sido os atos realizados pelo Poder Judiciário de ente federado, no caso o Tribunal de Justiça do Ceará.

- Lei 11.340/2006 – Lei Maria da Penha: criou mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da Convenção sobre Eliminação de todas as formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher.