1) DO RECURSO APRESENTADO A DECISÃO DA SEGUNDA PROMOTORIA DE PARANAÍBA QUE ARQUIVOU RECLAMAÇÃO REALIZADA EM FACE DA DECISÃO DA SEGUNDA VARA CÍVEL E TJ DO MS DE MANTEREM O CURSO GOLPE DE ESTADO DE 2016 SUSPENSO JUDICIALMENTE.
EXCELENTÍSSIMO SENHOR PROMOTOR DE
JUSTIÇA DA 2ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE PARANAÍBA - MS
REF. Notícia de Fato n. 01.2019.00009977-0
ALESSANDRO
MARTINS PRADO, já qualificado no autos da Notícia de Fato nº
1.21.002.000136/2019-32,
Ministério Público Federal
que declinou sua competência ao
Ministério Público Estadual,
Primeira Promotoria de Paranaíba/MS, vêm,
respeitosamente, a presença
de Vossas Excelências,
nos termos do Art. 10 da Resolução número 174 de 04 de julho de 2017,
Resolução número 02/2016 do Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais de
Justiça e MPs Estaduais, Art. 10, inciso XXVII da Resolução N° 003/2012/CSMP, Art.
11, §1° da Resolução nº 015/2007 e Artigos 5, IV IX, 6, 127, 206, 207, todos da Constituição da República
Federativa do Brasil
de 1988, interpor
RECURSO contra arquivamento da presente
representação.
RAZÕES
RECURSAIS
1) DA RECONSIDERAÇÃO DE ATO
O Recorrente, inconformado
com a decisão
pelo arquivamento da Notícia
de Fato instaurada a partir
da Representação apresentada ao Ministério Público Federal,
a qual narra
a violação a
direitos fundamentais decorrente
da suspensão, por decisão judicial arbitrária, do curso “Golpe de Estado
de 2016”, vem respeitosamente, perante Vossa Senhoria apresentar pedido de
reconsideração de ato, requer seja o presente pedido apreciado pelo Douto
Promotor de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul e, caso não seja o pedido
acolhido in totum, requer, nos termos do
Art. 11 §
6º, Resolução nº
015/2007-PGJ, de 27 de novembro
2007, sejam os autos encaminhados ao
Conselho Superior do Ministério Público para apreciação da presente peça com
efeitos recursais.
2) DA TEMPESTIVIDADE
O presente recurso deve
ser apresentado no
prazo de 10
(dez) dias conforme aduz
o art. 11,
§ 1º, da
Resolução Normativa 015/2007/PGJ. O Recorrente
fora intimado na
data de 11/09/2019 da
decisão recorrida, por intermédio do ofício de n.
0286/2019/02PJ/PNB. Logo, a presente manifestação torna-se tempestiva.
3) DOS FATOS E DA REPRESENTAÇÃO
Trata-se de Notícia
de Fato instaurada
a partir de
Representação apresentada ao Ministério Público Federal por meio do
Portal do Cidadão.
Referida Notícia
de Fato foi
instaurada, inicialmente, no
âmbito do Ministério Público
Federal que declinou sua competência para o Ministério Público Estadual de Mato
Grosso do Sul.
No âmbito
da representação houve
a solicitação de
apuração de possível violação
de direitos fundamentais
do representante, ora
recorrente, notadamente a liberdade de cátedra, liberdade de aprender e
ensinar, liberdade de livre expressão de atividade intelectual dentre outros.
Houve o registro da informação de que o representante, ora recorrente, é
professor universitário da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul e teve
Curso de Extensão devidamente registrado e aprovado pela instituição suspenso
por medida liminar
no âmbito de
Ação Popular número
0801502-
47.2018.8.12.0018.
Fora registrada a informação de que o Ministério Público Federal, no
âmbito de decisão emanada pelo Ministério Público Federal do Rio Grande do Sul
pacificou o entendimento no sentido de que intitulados cursos Golpe de Estado
de
2016 não podem sofrer intervenção Judicial.
Registrou-se
ainda que, a
despeito da decisão
do Supremo Tribunal
Federal no âmbito da Ação de Descumprimento
de Preceito Fundamental número
458/DF, houve
a manutenção da
decisão do Juízo
da Segunda Vara
Cível da Comarca de Paranaíba
quanto a manutenção da suspensão do Curso de Extensão intitulado “Golpe
de Estado de
2016, conjunturas sociais,
políticas, jurídicas e o
futuro da democracia no Brasil”.
Por fim, o
Ministério Público Estadual,
por intermédio da
Segunda Promotoria, arquivou a
presente Notícia de
Fato alegando que
não houve a caracterização de qualquer situação que
justifique a atuação do Ministério Público Estadual e que os fatos narrados já
foram judicializados nos autos da Ação Popular número
0801502-47.2018.8.12.0018.
4) DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
VIOLADOS
4.1) Do Enunciado 02/2016 do Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais
de
Justiça e MPs Estaduais
Leciona o Enunciado 02/2016, vejamos:
“São Princípios fundamentais imanente à educação brasileira as
liberdades fundamentais
de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber, o pluralismo de ideias e de
concepções pedagógicas,
a gestão democrática do ensino público, cabendo ao Ministério Público adotar providências cabíveis no sentido de coibir
tentativas de se estabelecer proibição genérica e
vaga de controle de conteúdo pedagógico nas escolas.” (Grifo
nosso)
Conforme se vislumbra
o Enunciado supra,
são princípios
fundamentais a educação
a liberdade de
aprender, ensinar,
pesquisar e divulgar a
cultura, pensamento, arte
e o saber, o
pluralismo de ideias
e de concepções pedagógicas, e,
é dever do
Ministério Publico a
adoção de providencias
para coibir qualquer
tentativa de se
estabelecer proibição
genérica
de conteúdo pedagógico nas escolas.
Nesse sentido, é cediço que a denúncia ofertada ao Ministério Público
deveria ser apurada por esse órgão e não arquivada, por ser de competência
deste.
Ademais, O Grupo
Nacional de Direitos
Humanos (GNDH), órgão
do Conselho Nacional dos
Procuradores-Gerais de Justiça
(CNPG), que congrega membros dos
Ministérios Públicos de
todos os Estados
bem como da
União deliberou quanto as propostas que seguem:
•
Instauração de PA (Procedimento Administrativo), PP (Procedimento Preparatório)
ou de Inquérito Civil (IC) para o acompanhamento e fiscalização das
situações onde sobrevenha
a proposta ou
edição de ato
normativo que visa implementar a Escola sem Partido (ESP).
•
Priorização a atuação
extrajudicial, mas caso
haja a necessidade,
o
Ministério Público pode acionar o Poder Judiciário através da Ação
Civil Pública.
• Representação ao
Procurador-Geral de Justiça
em caso de
Leis Municipais e representação ao Procurador-Geral da República para o
ajuizamento de ações declaratórias de inconstitucionalidade que instituam a ESP (II Reunião Ordinária do GNDH – Novembro/2016).
4.2) LIVRE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO
A liberdade
de pensamento é
consagrada na Constituição Federal
em seu artigo 5º - que versa sobre os direitos e garantias
constitucionais - inciso IV, e dispõe “é livre a manifestação do pensamento,
sendo vedado o anonimato”, criando um caminho real para um país democrático.
Define-se que a
liberdade de pensamento
como o direito
de exteriorização do
pensamento. Notoriamente é um
princípio que vem garantir a
liberdade individual, fortalecer a
democracia, criar ambientes em que o cidadão tem voz, contudo,
pode responder por seus excessos.
Para
demonstrar a importância
da liberdade de
expressão o Juiz
Federal e doutrinador George Marmelstein, leciona que:
Já que se mencionou o direito à manifestação do pensamento, vale
comentar essa importante liberdade que é um instrumento essencial para democracia, na
medida em que permite que a vontade popular seja
formada a partir do confronto de opiniões, em que todos os cidadãos, dos mais
variados grupos sociais, devem poder participar, falando, ouvindo, escrevendo,
desenhando, encenando, enfim, colaborando da
melhor forma que entenderem. A
esse respeito,
Stuart Mill, um dos principais defensores
da liberdade
de expressão,
argumentou que a verdade tem maior probabilidade de vir à tona quando existe um “mercado” de ideias livremente divulgadas e debatidas, de modo que os cidadãos poderão tomar decisões mais acertadas se as diversas
opiniões políticas puderem circular sem interferências. (MARMELSTEIN, 2011, p.
128).
Portanto, uma vez
cerceado o direito
do Recorrente de
expressar livremente seu pensamento
em ambiente acadêmico
tem-se caracterizado a violação ao principio constitucional
basilar.
4.3) DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO
É cediço
que a liberdade
de expressão é
pilar fundamental de sustentação da condição essencial para a
existência de uma verdadeira sociedade democrática, tanto
que em nossa
Carta Magna, encontra-se
inserida, no rol
dos direitos e garantias fundamentais, art. 5º, inciso IX: “é livre a
expressão da atividade intelectual,
artística, científica, e
de comunicação, independente
de censura ou licença”.
Nesse mesmo sentido
também dispõe o
Art. 220 da
Constituição Federal, vejamos: A
manifestação de pensamento,
a criação, a
expressão e a informação, sob
qualquer forma, processo
ou veículo, não
sofrerão qualquer restrição,
observado o disposto nesta Constituição.
Nessa senda,
verifica-se que a
liberdade de expressão
é principio fundamental
resguardado pela Carta Magna, logo todos os atos que suspenderam o
prosseguimento do Curso oferecido na Instituição de Ensino, viola frontalmente
o princípio em tela.
4.4) LIBERDADE DE CÁTEDRA
Inicialmente, insta conceituar
a expressão “Cátedra” a
qual deriva do latim
e significa cadeira magistral
ou doutrinária e
teve a sua
inspiração na influência da
própria cadeira de
São Pedro, a chamada Cathedra, Cathedra Petriou Cadeira de
Pedro, conservada até os dias atuais na Basílica de São Pedro, por ser um símbolo
da origem das
palavras e conselhos
magistrais, de sabedoria, razão
que inspirou também ao paralelo com a atividade docente como um direito de
defender suas ideias ou professar conhecimento.
No mesmo diapasão, o doutrinador José Celso de Mello Filho conceitua
a liberdade de
cátedra como o
direito que assiste
ao professor de exteriorizar
e de comunicar seus conhecimentos no exercício do magistério, e
acrescenta que a
liberdade de cátedra
constitui direito próprio
do que
exerce
a atividade docente1.
vejamos:
A Legislação Brasileira garante a liberdade de cátedra aos professores,
Art. 206, CF. O ensino
será ministrado
com base
nos seguintes
princípios:
II – liberdade
de aprender,
ensinar, pesquisar e divulgar o
pensamento, a arte e o saber;
III – pluralismo
de idéias
e de
concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas
de ensino;
(…).”
No mesmo sentido dispõe a lei de diretrizes e bases da
Educação:
Art. 3º
O ensino
será ministrado
com base
nos seguintes
princípios: I – igualdade de condições
para o
acesso e permanência na escola;
1 MELLO FILHO, José
Celso. Constituição federal anotada, p.
418, São
Paulo: Saraiva, 1984
II – liberdade de aprender,
ensinar, pesquisar e divulgar a
cultura, o pensamento, a arte e
o saber;
III – pluralismo
de idéias
e de
concepções pedagógicas; IV – respeito à
liberdade e apreço à tolerância;
(…).”
Ademais,
entende-se que a liberdade de cátedra é senão a liberdade da transmissão do
conhecimento onde o Docente, no
exercício da cátedra, em toda sua dimensão
de liberdade que se
perfaz pelo instrumento
dos atos de
ensinar, aprender, pesquisar e
divulgar seu conhecimento
observando a pluralidade
de ideias e concepções pedagógicas. Portanto, pode-se afirmar que a
cátedra não teria sentido se não fosse qualificada pelo contexto de liberdade.
A Ministra do
Supremo Tribunal Federal Carmem Lucia se manifestou da seguinte maneira em
análise a ADPF 548:
“Liberdade de pensamento não é concessão do Estado. É direito fundamental do
indivíduo
que
a
pode
até
mesmo
contrapor
ao Estado. Por isso não pode ser impedida, sob pena de substituir-se o indivíduo
pelo ente
estatal, o que se sabe
bem onde
vai dar.
E onde
vai dar
não é o caminho do direito
democrático, mas da ausência de direito e déficit democrático Portanto, qualquer tentativa de cerceamento da liberdade do professor em sala de aula para expor, divulgar e ensinar é
inconstitucional. ( ..) Também o
pluralismo de ideias está na base
da autonomia
universitária como extensão do princípio
fundante da democracia brasileira, que é
exposta no inc. V do art. 1o.
da Constituição
do Brasil.”
Conclui-se,
portanto, que fora violada a liberdade de cátedra no caso em tela, razão
pela qual, o
Ministério Público não
deveria ter decidido
pelo arquivamento da Notícia
de Fato e
sim instaurado inquérito
contra o ato
que violou o direito a liberdade de cátedra na Instituição de Ensino.
4.5) JULGADO QUE SE PERFILHA AO TEMA OBJETO DO PRESENTE RECURSO
ADMINISTRATIVO. AGRAVO
DE INSTRUMENTO. AÇÃO
POPULAR. SUSPENSÃO DE ATO ADMINISTRATIVO. UNIVERSIDADE FEDERAL.
CURSO "O GOLPE
DE 2016". LIBERDADE
DE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO. PLURALISMO DE
IDEIAS. ESPAÇO PARA CONTRAPONTO. Não há
motivo para alterar
a decisão agravada, principalmente porque
(a) o curso
de extensão universitária
sub judice não integra
a grade curricular
obrigatória dos estudantes (atividade facultativa); (b)
as disciplinas serão
oferecidas em horário diferenciado,
a título gratuito,
e aberto somente
para alunos da graduação
e pós-graduação; (c)
após a realização
de palestras, a maior parte do tempo será dedicada a debates, havendo
espaço para contraponto, e
(d) o curso já está em andamento desde abril de 2018, o que afasta o periculum
in mora, indispensável para a tutela de urgência pretendida.2
5) DA REFORMA DA DECISÃO
Ante o exposto, requer, sem prejuízo de outras providências entendidas
pertinentes por esse
Conselho Superior: a)
Seja dado provimento
ao presente recurso,
rejeitando-se integralmente a promoção e arquivamento; b) Caso o feito em
questão se trate de mero Procedimento Preparatório de Inquérito Civil (PPIC),
seja determinada a
instauração de Inquérito
Civil para a
colheita de outros elementos de
prova hábeis a
demonstrar a prática
de ato inconstitucional por inobservância ao preceitos
constitucionais declinados c)
Sejam dados aos segmentos sociais, inclusive, a OAB/MS,
oportunidade de se manifestarem quanto ao tema, objeto do presente recurso.
Paranaíba – MS, 19 de setembro de 2019.
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ALESSANDRO
MARTINS PRADO
2 (TRF-4 - AG: 50214312620184040000 5021431-26.2018.4.04.0000, Relator: VIVIAN JOSETE
PANTALEÃO CAMINHA, Data de
Julgamento: 17/10/2018, QUARTA TURMA)
2) DECISÃO DO CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO
3) CURIOSIDADE
Salvo Melhor Juízo, o recorrido seria quem arquivou a reclamação, no entanto, diante da decisão publicada no Diário Oficial do MP/MS, há necessidade de se apurar quem irá figurar como recorrido do recurso contra arquivamento realizado pela Segunda Promotoria de Paranaíba de reclamação contra suspensão judicial do Curso Golpe de Estado de 2016 ofertado como curso de extensão na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul - Unidade Universitária de Paranaíba.
4) Importante registrar que, salvo melhor juízo, é o único Curso Golpe de Estado de 2016 do Brasil que continua suspenso judicialmente.
5) A Procuradoria Federal de Defesa dos Direitos do Cidadão pacificou o entendimento em defesa da autonomia universitária e não cabimento da competência do MPF na análise do mérito de oferta de cursos Golpe de Estado de 2016. Veja o link:
6) Importante registrar ainda que na esfera federal foi pacificado o entendimento de que referidos cursos não devem sofrer intervenção do Poder Judiciário e todos os Procedimentos Preparatórios ou Ações contra cursos similares foram arquivados. Consulte os links:
5) Por fim, decisão da APDF 548 também já pacificou o entendimento em respeito a Liberdade de Cátedra, da liberdade de pensamento, dentre outros direitos fundamentais. Veja os links:
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